quarta-feira, 25 de setembro de 2019

"O que te faltou?" - Evandro Goebel


Evandro Goebel, de nacionalidade brasileira e sérvia (desconhecia esta possibilidade), centro-campista, com passagens por Estoril de Praia (16 golos, 10 assistências), FC Porto (6 golos, 2 assistências), Estrela Vermelha (16 golos, 12 assistências), Hull City (5 golos, 4 assistências) e clubes brasileiros, entre eles o Santos, onde ainda hoje faz parte do plantel.

Cumpriu, até agora, 326 jogos onde faturou 48 golos e proporcionou 38 assistências. Para médio, bons números. Participou na Liga Europa e Liga dos Campeões, o que só por si já deixa ciumentos muitos outros canarinhos com o sonho europeu.

Ficam as estatísticas. Assunto resolvido, vamos ao que interessa.

Assim como o golo nos apaixona neste jogo, espero que sejam estes os motivos que vos prendam à leitura.

“Porquê ele?” – questionam eles.
- “Parece insensato?” – pergunto eu.
- “SIM!” – respondem eles, afirmativamente.
- “Então deixem-me explicar.” – respondo eu, seguro de mim.


Fez-se silêncio, tenho a vossa atenção e serei agora testado. Venha isso!

Na época 2012/2013, se bem se lembram, o Estoril de Praia conseguiu (com muita injeção financeira de capital canarinho) o apuramento para a Liga Europa, fazendo história e juntando-se ao Paços de Ferreira, naquilo que seria uma época estranha do futebol português.

O futebol era bom e destacado, com exibições sorridentes, sendo bem praticado. Esse que era correspondido pelos golos de Steven Vitória (sim, um defesa melhor marcador) e Luís Leal (sosseguem, este já era avançado), passando assim do bonito ao eficaz.

Destacavam-se os golos, os dribles de Licá e Carlitos, a definição e irreverência de Carlos Eduardo, a profundidade de Jefferson e a muralha que era Steven Vitória e Yohan Tavares. Quase todos estes haviam de chegar a um grande, acompanhados por mais um - Evandro.

No papel de 8, era mestre da ligação entre um 6 (trinco), Diogo Amado, e o distribuidor de último terço, 10 moderno, Carlos Eduardo. Permitia queimar linhas, sair de situações com bola controlada e, mesmo assim, segurar defensivamente uma segunda linha de pressão, descansando Carlos para tarefas ofensivas. Um despercebido do qual Marco Silva nunca abdicava. É assim a norma: quem fala e é capa nos jornais, no balneário é segundo plano. E os tímidos, aos olhares dos espectadores, afirmam-se entre as quatro paredes e consideração dos colegas. Até porque só assim vingam!

Certamente, os centrais quando levantavam a cabeça já procuravam Evandro e bastava-lhe movimentar-se, pois sabia que a bola vinha e depois estava entregue à sua arte.

Confiante, distribuía e, na transição defensiva, definia momentos de pressão ou contenção. Esqueçam a braçadeira… São estas as referências. Um passo deles é ordem para a equipa e assim os grandes jogadores destacam-se.

Chamava a atenção para este médio, que já aparecia com idade avançada para chegar ao top do top. Com o aviso parecia louco e no início deste texto também vos pareço. Mas sem receio, é só mais uma humilde opinião de um rapaz que gosta tanto do desporto rei como qualquer um de vós.
Mas a timidez chegou à capa, fazendo o que fazia melhor!

Não falou, destacou-se em campo. No dia 23 de Fevereiro de 2014, agora uma época depois, numa exibição pobre do FC Porto no Estádio do Dragão, a invencibilidade caseira de 5 anos era derrubada por um penálti de Evandro.

E ali, mesmo à frente do acontecimento, eu dizia ao meu amigo, “Agora será jogador”.

Teve o impulso necessário e vir-se-ía a transferir para o conjunto azul e branco, num ano de transferências atípicas, ao leme de Lopetegui. Dos muitos milhões gastos, este foi uma pechincha! Pelo menos assim achava…

Nunca se conseguiu afirmar e num papel de rotação nunca foi muitas vezes usado a titular. Mas enquanto jogava cumpria e passava despercebido, o que por si só é sinal de competência.

Naquela posição, não se fazer notar é não errar. É fazer o que é pedido, ajudando a equipa, mantendo a pressão adequada e ser solução intermédia na criação e, mesmo sem definir, ser decisivo. Não para os milhares que se sentam na bancada, mas para as unidades que se sentam no banco.

Lembro-me em especial de um jogo: 23ª jornada da liga Portuguesa da época 2014/2015. Dia de clássico. O dragão era palco de mais um jogo entre azuis e verdes, ambos acompanhados de branco.

O rescaldo do jogo é simples, 3-0.

Sporting muito fraco a controlar a profundidade e a velocidade de Tello, exemplarmente assistido por Jackson, define o jogo. Hat-trick e nas capas de jornal falava-se castelhano. Simples, fácil e não deveria haver mais discussão. Era um hat-trick!

Mas um olhar atento a isso não permite.

Se há oportunidade de construir é porque a bola foi recuperada. Se é no último terço recuperada, então a pressão funcionou e nesse contexto lá andava ele. Evandro no campo e linhas bem orientadas, pressão exemplar e bolas recuperadas. Passes simples e ponte entre as transições de saída e os últimos passes, que pertenceram a Herrera e Jackson. Ou seja, mais uma vez papel cumprido e com mestria!

A constante manteve-se e Evandro continuou o seu papel de rotação e sempre escondido.


O que te faltou?

Para mim nada. Louco e radical? Foi como comecei.

Só faltou a perspetiva - reparem em Uribe (gosto muito deste jogador). No clássico da Luz, foi muito elogiado pela comunicação social, como pêndulo de equilíbrio e “bla bla bla”.

Ora aí está.

Valorizado externa e internamente por adeptos e treinadores.

Porquê? Porque foi merecido e felizmente a opinião futebolística mudou! O olhar está no detalhe e na forma como a equipa se apresenta. Já poucos são aqueles que apenas reparam e observam a finta mais bonita e o golo mais artístico. Não fosse isso e não tínhamos Van Djik como está. Não fosse isso e o jogo de pés de um guarda-redes não era nos debates comentado. Não fosse isso e os passes “simples” de Xavi e Iniesta, não seriam também a MAGIA de um Barcelona.

Evandro, lamento teres tido a prestação certa na altura errada. Hoje serias mais lembrado e terias tido outro efeito. O jogo precisa de vós - dos que fazem uma falta no momento certo e param o jogo quando necessário. Jogam atrás para recomeçar a saída e queimam linhas com um passe de 5 metros. Virtuosos com a bola sempre haverá, de truques está o mundo cheio. Mas carecem aqueles que em segundos vêm os detalhes e, como sempre, os pormenores fazem a diferença.

Por isso, Evandro, desculpa.

Perdoa o olhar atento que ainda andava a ser treinado. Perdoa a falta de coragem de um treinador em dar-te tempo e fugir ao mediatismo dos que por muito eram contratados e tinham de jogar. Perdoa a falta de gestão estratégica. Longe vão os tempos em que a sabedoria dos grandes passava por contratar jogadores do campeonato português, sem necessidade de adaptação a um estilo, trabalhando-se a exponenciação de outras vertentes mais importantes. Agora queremos vender. Não interessa a qualidade do praticado, os negócios internos que eram a sobrevivência e plano de crescimento dos mais pequenos também não. Interessa ter os melhores números.

Mais uma vez desculpa. Tinhas o certo, mas não fomos o certo para ti.

Perdoem-me também a loucura da análise, é uma opinião e espero que a respeitando, um dia a possam perceber.

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